Epístola de um Templário: A Ordem de Dante


Aos cuidados do Venerável Mestre da Sagrada Ordem, sob o Selo da Cruz e da Espada,

Jerusalém, no ano do Senhor de MCCXLVII.

Mestre amado e respeitado,

Que a Paz do Cristo Ressuscitado e a Luz do Verbo eterno estejam sempre contigo.

Venho por esta carta informar-te que, após longa deliberação com irmãos de confiança, decidimos deixar os muros outrora sagrados de Jerusalém e empreender jornada em direção à Europa. A antiga fortaleza da fé se encontra fragilizada, diluindo-se nas sombras do engano e da perfídia. Infiltrados do crescente otomano e traidores revestidos com o manto da lealdade corromperam a pureza de nossa Ordem, e por isso, urge-nos preservar a chama original em terras onde ainda há esperança.

Contudo, não partimos de mãos vazias. Trago comigo uma joia espiritual de imensurável valor: a obra do irmão Dante Alighieri, da Ordem Iniciática dos Fideles d’Amore, ramo oculto e devotado da fidei sanctarum. Essa Ordem, envolta em véus de mistério, floresceu nos séculos passados como um jardim oculto de saberes esotéricos, alquímicos e cristãos, entre os nobres que buscavam o Amor Verdadeiro — não carnal, mas aquele que é símbolo da união da alma com o Divino.

Mestre, embora os cronistas do mundo exterior pouco conheçam ou reconheçam tal fraternidade, nós, iniciados, bem sabemos da veracidade velada que habita nos símbolos. Os Fidèles d’Amour, como os antigos Rosa-Cruzes e os nossos próprios predecessores templários, trilharam a senda secreta, onde o amor cortês é o reflexo terreno do Amor Celestial, e a alquimia do espírito transforma o chumbo do homem no ouro da alma desperta.

O irmão Dante, inspirado pelas luzes da iniciação, nos legou na Divina Comédia mais que um poema: um verdadeiro mapa da ascensão interior, onde o inferno, o purgatório e o paraíso são espelhos da jornada do espírito humano — do aprendiz que caminha na escuridão, ao companheiro que purifica-se nas provas, até o mestre que contempla a Luz.

Beatriz, sua musa e guia, é para os olhos profanos uma mulher idealizada. Mas nós, que somos do caminho, vemos nela o arquétipo da Sophia divina, a personificação da Sabedoria Celeste, guardiã dos mistérios e condutora à visão beatífica.

Guardamos estes segredos com zelo, codificados em imagens e cifras que apenas os olhos do iniciado podem decifrar. Enquanto os ignorantes recitam versos, nós ouvimos os ecos da Verdade. Enquanto os letrados se encantam com a forma, nós penetramos o sentido oculto.

Peço, pois, vossa bênção nesta nova travessia. Levamos conosco a chama do Templo interior, e sob o manto da Fidelidade e do Amor, lutaremos para preservar o sagrado que nos foi confiado.

Em Cristo e pela Luz da Rosa e da Espada,

Frater Iohannes de Alverna, Cavaleiro da Ordem dos fideles

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