Desvendando o Inferno

DESTRINCHANDO O INFERNO 
por Fábio correia




imagem: Google

  

Para entender o conceito místico cristão de inferno, é necessário, em primeiro lugar, compreender sua origem pagã e supersticiosa. Trata-se de uma ideia que, embora amplamente difundida no imaginário cristão, não pertence originalmente à tradição judaico-cristã, mas foi incorporada por meio das influências dos gentios cristãos greco-romanos.

O inferno, nesse contexto, é um termo religioso que remete à condenação ou ao cárcere eterno — frequentemente associado a uma subdimensão alegórica, semelhante ao submundo: cavernas, abismos, masmorras, catacumbas e túmulos.

O Caos

Tudo começa na tradição grega antiga, segundo a qual existiam grandes deuses titãs — que, na verdade, simbolizavam ideias sobre a origem do universo e do mundo. Um desses titãs era o Caos: um abismo cósmico sem forma, mas do qual emanaram as trevas e as regiões abismais conhecidas como Tártaro e Hades.

O Caos era concebido como uma espécie de matéria cósmica primordial, quase espiritual, semelhante a uma ameba que, ao se fragmentar, gera novas entidades. Dessa forma, do Caos nasceram o Tártaro (os abismos antigos do cosmos), a Noite Cósmica e a própria Mãe Terra (Gaia).

Segundo poemas épicos gregos, os antigos deuses titânicos, filhos do Caos e da Terra, entraram em conflito com os deuses olímpicos. Após serem derrotados, esses titãs foram condenados às prisões do Tártaro — um lugar profundo e sombrio no submundo.

Esses conceitos e imagens do submundo grego foram mais tarde utilizados para representar os infernos na tradição cristã.

Os Três Tipos de Inferno na Tradição Cristã

Na tradição cristã, existem três concepções distintas de inferno, todas relacionadas à ideia de condenação ou morte espiritual. Esses "infernos" refletem mais as influências culturais e mitológicas greco-romanas do que a teologia hebraica original. A partir disso, a ideia de inferno como um lugar físico de tormento eterno foi se desenvolvendo ao longo dos séculos, fortemente influenciada por essas camadas simbólicas e místicas herdadas da antiguidade pagã.


O que é o Tartaro segundo Bíblia cristã e na mitologia grega ?

imagem ilustrativa: Tártaro ( Google )

TÁRTARO: O Inferno do Mundo dos Anjos

O Tártaro é concebido como uma masmorra cósmica destinada a seres espirituais. Trata-se de um abismo profundo, envolto em trevas, semelhante a um oceano sombrio. Segundo essa visão, é nesse lugar que estariam aprisionados os anjos rebeldes — incluindo Satanás.

O termo “Tártaro” é mencionado apenas uma vez na Bíblia, especificamente no Novo Testamento, na segunda epístola de Pedro, capítulo 2, versículo 4. Nessa passagem, a palavra é utilizada para descrever um local de punição reservado aos anjos caídos.

O que é o Hades/ SHEOL segundo a mitologia grega e a Bíblia?

imagem: cemitério ( Google )

HADES: O Inferno do Mundo dos Seres Humanos

O Hades representa o inferno relacionado ao mundo dos seres humanos. É associado a lugares como cemitérios, catacumbas e o mar — locais onde corpos humanos são depositados após a morte. Em hebraico, esse conceito é denominado Sheol.

Na mitologia grega, Hades é o deus do submundo, o reino dos mortos, onde vão tanto os justos quanto os ímpios. Essa concepção influenciou profundamente a tradição judaico-cristã, especialmente durante o período helenístico. Assim, o Sheol passou a ser compreendido como o destino comum de todos os mortos, independentemente de sua conduta em vida — uma espécie de “morada dos mortos”, semelhante aos cemitérios atuais.

O termo Hades (grego) ou Sheol (hebraico) é mencionado aproximadamente 70 vezes na Bíblia Sagrada. Esse "inferno" se refere à morte física — a separação do corpo da vida, a experiência universal da humanidade


O que seria o Lago de fogo e enxofre/ GEENA ?

imagem : lixão ( Google)

GEENA / LAGO DE FOGO E ENXOFRE

O Geena não representa um local físico, mas sim um estado de condenação eterna, reservado aos anjos rebeldes e aos seres humanos que não se arrependeram de seus atos durante a vida. Esse inferno só se manifesta após o tribunal do fim dos éons — um tempo cósmico que marca o encerramento da história espiritual da humanidade.

O termo Geena foi originalmente usado pelos judeus para designar um lugar real: o vale de Hinom, situado fora das muralhas de Jerusalém. Ali, queimavam-se lixo e corpos de condenados, indigentes e pessoas sem recursos para um sepultamento digno. Usava-se enxofre para manter o fogo aceso e acelerar a incineração. Esse vale tornou-se, com o tempo, símbolo de impureza, maldição e rejeição.

Jesus utilizou esse cenário como metáfora da condenação eterna. No livro do Apocalipse de João, o Geena é descrito como o "lago de fogo e enxofre", a segunda morte, onde a existência tanto da matéria quanto do espírito é extinta para sempre, sem possibilidade de retorno. O termo "Geena" é citado 12 vezes na Bíblia Sagrada.

Comparações e Exemplos

Quando alguém visita cemitérios, catacumbas em Paris, crematórios, ou lugares como o Titanic, no fundo do Pacífico, está, simbolicamente, visitando o inferno (Hades/Sheol) — o mundo dos mortos humanos.

Quando alguém é condenado à morte por um tribunal — como nas execuções da Inquisição ou em regimes que ainda aplicam a pena capital — essa pessoa participa, de certa forma, da experiência simbólica do Geena, a destruição definitiva e pública do corpo e da dignidade.


Já o Tártaro permanece como uma dimensão de punição exclusivamente espiritual, voltada a seres como anjos caídos e titãs. Não pertence ao mundo dos humanos.

O inferno e o paraíso, portanto, não são apenas lugares, mas estados do corpo e da consciência. O termo “inferno” foi generalizado nas traduções, muitas vezes sem respeitar os significados distintos de Tártaro, Hades e Geena, o que gerou confusão teológica ao longo dos séculos.

A fé cristã se entrelaça com culturas antigas — grega, romana e judaica — e, por isso, compreender o inferno exige discernimento histórico, linguístico e espiritual. Não tema o inferno em si, mas o julgamento da sua própria consciência.


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Anjos e Demônios

Ao falar de anjos e demônios, estamos nos referindo aos mesmos seres espirituais invisíveis. A diferença entre eles está no estado de sua consciência:

Anjos: consciência justa, santa e alinhada à vontade divina.

Demônios: consciência corrompida, caída, em rebelião contra o bem.


As representações comuns — anjos com asas de pomba e demônios com asas de morcego — são simbólicas. Elas não descrevem a verdadeira forma desses seres, pois, segundo a tradição cristã, espíritos não possuem forma física, seja humana ou animal. São energias conscientes do mundo espiritual e se manifestam conforme a capacidade da mente humana de compreendê-los.

As asas são símbolos de suas funções e estados: leveza, pureza ou, ao contrário, decadência e escuridão.





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