O Dia da Entrega
Certa feita, uma mulher de semblante enigmático chamada Mavet aproximou-se de um homem abastado e sussurrou: "Acompanhe-me". Em seguida, dirigiu-se a um homem humilde e igualmente o chamou: "Acompanhe-me..."
Conduziu-os, então, até uma caverna sombria e, ao adentrar aquele recôndito, ambos indagaram em uníssono: "Por que nos trouxeste até aqui?"
Mavet, com voz serena e implacável, respondeu: "Viestes para entregar tudo que não vos pertence."
O homem rico hesitou, mas retirou seu imponente relógio de ouro e o entregou a ela. O homem pobre, por sua vez, tirou os chinelos gastos e humildemente os entregou.
Mavet prosseguiu: "Isso é apenas o início; há mais para oferecer."
O abastado, ainda relutante, retirou suas vestes de grife e as depositou em suas mãos. O pobre fez o mesmo com suas roupas desgastadas, entregando-as sem resistir.
Com um olhar impassível, ela ordenou: "Ainda não terminamos; entreguem mais."
Com semblante abatido, o homem rico ofereceu seus diplomas e cargos, enquanto o homem pobre estendeu sua enxada e seus simples instrumentos de trabalho.
"Ainda não é o suficiente. Quero tudo," decretou Mavet.
Indignados e incrédulos, ambos exclamaram: "Como assim? Isso é um assalto?"
Ela, porém, sem alterar o tom, respondeu: "Não protestem; apenas entreguem."
O homem próspero, já quase sem forças, entregou seus nomes, títulos e legados. O homem humilde, resignado, entregou sua paternidade e suas raízes.
Eis que restaram apenas seus corpos desnudos. Exaustos, disseram em coro: "Nada mais temos para lhe ofertar."
Mavet, então, recolheu tudo o que eles haviam entregado, deixou no meio do caminho e partiu.
Quando deu seus últimos passos por aquele sombrio trajeto, o homem rico e o pobre caíram mortos ao solo, desprovidos de seus corpos e de seus espíritos. Restou apenas o vazio absoluto, um vácuo insondável, sem sequer o eco do silêncio, que por si só ainda é algo.
Mavet, assim, revelava-se em sua verdadeira essência: a própria Morte.
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